domingo, 26 de outubro de 2014

Por onde anda o tempo?

O tempo falta
Ou salta para não pensar
O tempo passa e a palavra descansa sem fala
Rimas dormem nos versos que se encolhem
Sem tempo para espalhar sonhos guardados.
Falta o tempo de inspirar o que areja as melhores ideias
E de recuperar os momentos das palavras certas.
A inspiração é um passo
Poesia às vezes é trabalho
Rápido quando vem direto do atual peito cansado.
Sem tempo, acelera batimentos
Mantém o foco na respiração
Rápida demais para contemplar o que nos move.
O dia que a atualidade acabar
O corpo se acalma e ouve os olhos
Que enxergam mais que a alma
Sabem quando o passatempo não espera
Marcam palavras que trazem ideias acordadas
Sonhadas além do papel.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

A casa de ontem

Hoje, a casa está fechada.
Quando abro a porta, entro pela sala
Percebo os detalhes da cabala
Cerâmicas sertanejas
Artesanato de praia
E plantas secas.
No canto
Muitas almofadas
Em cor rubra e mostarda
Na janela
Cortinas de chita perto da escada
Cactos na varanda
Ao lado das orquídeas brancas
Murchas sem se hidratar.
Os bambus envernizados são o contorno dos quadros
Iluminados por lustres entre palhas trançadas
O pano de saco cobre o sofá
Fofo em tecido de retalhos
No canto de lá
Mais almofadas alaranjadas
Como outros detalhes da casa.
Nos tapetes
Aroma de sálvia
Sabonete líquido
É de eucalipto
O banheiro exala
Alfazemas no box
Só para os hóspedes
Banheira salgada em sais coloridos
Poltrona de porcelana
Puro decorativo que descansa
A velha comparsa de suspiros.
O olhar para fora
Vê a vida que se renova
No dia de sertão raro
Torna úmido o que a natureza fez chover.
Mais uns passos, o quarto
Azulejos quebrados na varanda
Rede através da moldura branca
Piso sem brilho e cadeira de balanço
Porta de vidro
Vista além do sítio
Reconhece de longe o rio
Entre campos e nuvens em preto e branco
Quase chove e faz frio
Traz de volta a época de criança
O motivo da casa fechada
Do cachorro não esperar na escada
Do louro que agora se cala.
A casa continua aurora
Sem dono é como sono que não se acorda
Lembrança de primavera ou outono
Quando vínhamos todos passear
Em feriados, com direito às flores e ao pomar
Os mais velhos velejavam
E tinha quem gostasse de pescar
As crianças queriam de tudo
Ficavam nos fundos pra brincar
As avós plantavam e regavam
Cozinhavam doces e vários pratos
Enfeitavam a mesa de flores
Abriam a porta pra quem quisesse chegar
A mãe cuidava dos enfeites e das compras
Dos animais e das pernas longas
Enquanto os homens se enrolavam com a lenha.
No tempo em que o fogo era brilho
Bons tempos de amigos e família
A turma chegava e saía
No ontem que valia a pena
Sem regras rígidas pra respeitar
A ordem do dia não se perdia
Era celebração da vida em primeiro lugar
Enquanto hoje, a porta está fechada
É preciso esquecer as mágoas
E abrir pra recordar.  

A morte de quem fica


A morte de quem fica
É a angústia de quem não sabe lidar
Com o medo de perder a vida
Sem deixar algo pra lembrar.

Entre o filósofo, o poeta, o físico e o ermitão

Estavam todos abertos a uma boa discussão
O filósofo, o poeta, o físico e o ermitão
Viviam em agito interno estático sem obrigação alienada
Pensando em teorias de vida ou jantares suicidas
Nos lugares onde a angústia e a celebridade são visitas
Às futuras tentações já vencidas.

Muitos pensamentos
Erguidos sob o sol e à noite
Quando não mais se ouve defeitos de fabricação
A música é aliada de todos
Ondas se propagam nos sonhos e no desgosto de poucos
Conclusões surgem como urgem novas ideias
A solidão conduz ao inconsciente que se torna
Virada de copos e falência de traumas
Por vezes fúnebres nas associações reais.

Impreciso é o fantástico em ocasiões banais
Todos amam como animais poéticos
Que garantem inspiração aos loucos realistas
Deduzem, criticam e caçam estratégias
Muitas são benéficas e funcionam como ligas
Em situações que plainam sem invejas
Não se atêm aos pequenos dramas existenciais
Curvas dão volta na primeira impressão
Fica a malícia e o gosto pela autocrítica
A disseminar novas formas de subversão.

Vivem dia após dia na mente que sussurra
Daime paciência para demolir ditaduras
E levar vida de santo
Como quem se banha em água pura
No peito dos homens de branco
Daime calma e estômago de soprano
Que exalta o ronco da canção que não merece
Posições relativas de um observador que critica
Não considera o movimento do pensamento
Quântico e acelerado nos vocábulos
Que agem rápido em qualquer direção.

Micros os desejos não são
Exprimem sonhos ainda não conquistados
Vagam como reflexões que perduram
Em busca de razões ocultas
Que se refletem nas sombras côncavas
Quando dobram as esquinas
Enquanto ágoras são erguidas
Dilatam-se vidas
Que unem literatura e física
Em linhas homéricas dionisíacas
Entre os que escolhem e não se identificam
Vivem pelas florestas de modo alternativo
Longe dos outros que decidem os motivos
Como metáfora que não se explica
O mundo em suas diferentes formas de vida.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

As decisões gritam

As decisões gritam para se materializarem em planos resolvidos sem erros de pretensão.
Cabe a quem sabe o desejo – que estimula o corpo inteiro a continuar os trabalhos em perfeitas condições – aceitar as ideias mais certas e torná-las amigas das alegrias da vida. Os músculos estão exaltados e o ritmo acelerado alimenta tensões. A calmaria pretendida está também nas simples ações do dia como um banho salgado, música resguardada do armário e flores na mesa que serve boa comida leve. O próximo passo é ressuscitar os ânimos e acordar o corpo para acender pensamentos e transformar todo o conjunto em produtor eloquente sem desastrosas pretensões. Finalmente, as decisões sussurram e agradam o desfecho da história, tornando (o que parecia só retórica) a diluição da tensão. 

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O navio atracou


O pequeno navio atracou, mesmo com tanto mar à frente, tanto azul e céu sem fim nas estrelas.
Mesmo com tanto amor, atracou.

O ponto de partida tornou-se chegada quase definitiva
Para onde não se sabe, nem o vento indica a melhor direção
Mas é fato que o tempo corrói o instrumento de navegação
E a pressa urge como pauta latente.

O pequeno navio atracou
Mesmo com tanto amor
Com vistas para o nascente e o poente.

Que seja temporário esse naufrágio
Que seja pausa para recuperação.

Quando assumir o leme
O continente é uma escala
Possibilidades para desabrochar...
Paisagens irradiam novidades a cada nascer do sol
E segue a passagem das nuvens sobre velas e cabeças.
Em tai chi, buzinas são alternadas ao som do suave sopro
A lua curta é quebrada em tons soltos refletidos na água
Torna-se enorme sob atmosferas pouco visitadas
Diferente do que acontece em terra.

Enquanto o mar insinua mistérios
Traz belos pares andorinhos
Corcovado, gávea de pedra...
Crespúsculos são cumprimentos entre céus vizinhos.

Quando vira o vento e o navio
À deriva na vida só quem não parte
Chegar é sair para novos ares
Escolher entre dois caminhos
Ou viver pelas margens.

Como pode um poeta...

Como pode um poeta triste falar de otimismo em sintonia com o coração?
E como um poeta alegre pode palavrear a vida sem esperança?
As marcas estão na memória, na pressão das palavras, no lápis que funciona como instrumento de verbalização. As histórias internas entrelaçam-se aos fatos concretos e indicam o que o corpo e a mente podem fundamentar. O que emociona estimula os sentidos, “pro-cria” atitudes e o comportamento das novas páginas da vida, seja em relação a pontos positivos ou negativos.
Não é à toa que os biógrafos dos artistas fazem sucesso entre os que analisam e apreciam as obras. Só não sei o que fazem os que têm nas artes - como na escrita - uma necessidade, mas não querem se mostrar.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Nova cavalgada

As impressões da semana continuam...

Nova cavalgada 

E meu amigo reconhecido foi cavalgar
Como mestre encantado
Por um mundo desconhecido a compor outras histórias
Deixou pegadas infinitas, rimas bonitas
Lição que não cabe na ficção
Mas permanece na memória.
Êta homem, andante de um sertão rico
Onde não padecem as palavras
Entre Chicós e Joãos-Grilo

Ideias perambulam através das cenas...
São mais que poemas
Não ficam só nos contos de fadas

Da terra que tão pouco se desenha
Trajetórias tortas marcam o inusitado
Páginas borradas por lágrimas
Felizes pela longa jornada

Novos andantes e o legado
Que continue a cavalgada!

domingo, 20 de julho de 2014

A parte que me encanta

A parte que me encanta
Abranda o doce que me salta
Foge e reage ao meu ‘contrataque’
Mas ainda é boa lembrança
Uma espera como se me transformasse
Relendo poemas antigos
Recordações de alguns amigos
E retorno ao que me queima
Arde com ternura
Ao acender duas almas nuas
Sorri quando assopra
Tudo como outrora aprontava
Nada pouco pra quem consolava
A parte que me encanta
Foi-se breve
Vira e volta a deixar-me alegre
É passado, é lembrança
É texto que escreve reconhecidos caminhos
Conta minha história
Os motivos da fuga do ninho
Penso e digo pra quem me toca
Daqui não volto
Sei que fico na porta como cachos de uvas
Substância que revigora
E quando me devora a fruta
Revisito a curva
Que me traz o afeto.
Hoje pouco importa
Onde quer que eu esteja
Eu me queimo e você me assopra.

Impressões da Semana

No final da mesma semana, as despedidas de J. Ubaldo Ribeiro e de Rubem Alves. É inevitável pensar na morte e fazer reflexões em torno do assunto. Rubem dizia o contrário sobre sermos parabenizados por mais um ano de vida a cada aniversário. A seu modo, temos menos um ano de vida a cada aniversário. Mas, no caso desses autores, a morte é só descanso para o corpo. O resto todo continua por aí, vivo, por tempo indeterminado. Ubaldo Ribeiro dizia que somos capazes de nos apaixonar por tantas pessoas que conseguirmos nos lembrar. As histórias e as reflexões não serão esquecidas. São como pessoas a se manifestar. As obras tornam os escritores vivos sem previsão de menos anos ao aniversário de cada livro. As palavras e as consequências deixadas por seus articuladores são apaixonantes e não se vão. São como as árvores e os filhos para a próxima geração.


Escritores não morrem

Escritores não morrem
Viram letrinhas espalhadas
Voando pelas estantes
Pelas mentes dos que acolhem as palavras.
Escritores são highlanders
Desentortam linhas de cadernos sem páginas
Tiram a fala para o saber nas entrelinhas
A vida que esperamos fraseada
O mundo que conhecemos de casa
E fora do ângulo de visão dos que correm
Escritores não morrem
Soltam letrinhas de mãos dadas
Que perambulam por onde deixá-las
Pelos computadores que também voam
Pelas estantes limpas ou empoeiradas
Vivem nas mentes dos que acolhem as palavras.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Projetos, Cultura e o Sujeito no Meio Desta Vida Dura


Dias efervescentes pensando em cultura... Mais uma vez, a intensidade de agora é devido à construção de novos projetos, que não deixam de ser de vida, profissão, lazer e afeto. O momento do planejamento é uma fase muito rica, na qual cabem análises sobre o que já fizemos, como eram e como são/estão os contextos, as interferências internas e externas, a relevância e a contribuição para o meio em que vivemos e até quem somos em relação aos resultados esperados.
Depois de anos mudando de ambientes, em busca de aprendizado, oportunidades e reflexões abrangentes, cada passo não deixa de se relacionar ao vasto campo da cultura em seus diversos aspectos. As ideias e os ideais não têm fim. Eles “sobrevivem” em torno das produções culturais amplamente divulgadas; das que se espalham em nichos por região; das políticas que sempre nos esbarram; da mídia que mostra alguns trabalhos e influencia novas manifestações; do que ainda permanece escondido ou visto somente pelos próximos; de como acontece nos setores públicos e privados, na economia, no marketing; e a criatividade em torno disso tudo... “Relações de poder” está entre as palavras-chaves.
Ufa! São só alguns dos pontos que inspiram, desanimam ou animam, confrontam valores e ações, mas tocam e fazem borbulhar ideias novas que parecem não caber em uma só cabeça. Mas, além do que podemos fazer individualmente com nossos planos, não tem como deixar de pensar em colaboração, formação de redes, estabelecimento de parcerias e em como definir novas formas de produção, contribuindo para formar novas culturas.
Balanços constantes têm relevância. Por isso, é enriquecedora a saudade de tempos atrás, quando o desejo principal era simplesmente fazer, ver acontecer e acessar ao máximo o que a cultura oferecesse. No entanto, como isso tudo era só uma parte do todo que envolve vivenciar e fazer cultura, aos poucos, gritaram outros fatores que se relacionam a ela.
Não é que, em outros momentos, havia pouca reflexão ou ignorância em relação às entrelinhas dos caminhos que se cruzam na cultura do nosso país, mas, quanto mais vivência, mais oportunidades temos de comprovar hipóteses negativas e de sentir, ao longo dos anos, o cansaço e o peso da labuta por nos mantermos nessa vida, enfrentando os obstáculos para fazer acontecer. O lado bom é que, entre médios e baixos, a gente se diverte e, seja como for, realiza. E há, ainda, os momentos de pausas, reinício de processos, reinvenção, espera pelos altos e contínuo aprendizado. Sempre há tempo de fazer melhor.
O ciclo se repete e se compara à obsessão de rodar e rodar, mudar de área, fazer mais cursos para ampliar a formação, mudar de cidade, de objetos de empolgação; e ver que permanece com o mesmo fio condutor, que faz conexões, se curva, dá voltas, transforma-se em infinito e faz continuarem os mesmos objetivos. Enquanto houver vida, haverá amor pelas artes, pelo conhecimento, pela cultura de forma geral. Estar de qualquer maneira envolvido nisso é o principal objetivo. Contudo, a grande certeza é que as coisas acontecem quando investimos. 
Que não se cansem os projetos!

Lembro-me agora de um poema – de outros tempos – para matar a saudade daquela época e comemorar o hoje e a bagagem que é sempre requisitada.

Arte

Somos partes
Somos ocos
Ou somos Arte?
Começamos com dentes fortes
Acabamos sem força para usá-los
Somos obras modulares
Naturalmente copulares
Mutáveis por abraçá-los.
A meta não é abrirmos espaço para nossas criações artificiais
Torná-las a exposição mais disputada
Que só entende quem sabe mais.
Porém não mudam como nosco
Mas permanecem vivas sem dentes tortos
E mesmo sendo nossas partes
Quem são ocos?
Quem somos Arte?

quarta-feira, 4 de junho de 2014


Para lembrar algo que acontece de repente e, quando é percebido, já passou.

De Repente


De repente
Do nada
Surgem
Urgem
Delicadas palavras
Inca da tom
Ouvindo simplesmente
Verticalmente sons
Horizontais na noite
Sente-se prazerosamente
O enfim que tanto queria
E ainda podia
Reprisar diversas cenas
Por diversos dias
Vezes diversas
Com porta da mente
Ainda assim era questionável
Porém, algo aconteceu
Respondeu o imaginável
“E não mais que de repente”
Des urgem no nada
Onde não mais existem
Aquelas palavras.