segunda-feira, 1 de setembro de 2014

A casa de ontem

Hoje, a casa está fechada.
Quando abro a porta, entro pela sala
Percebo os detalhes da cabala
Cerâmicas sertanejas
Artesanato de praia
E plantas secas.
No canto
Muitas almofadas
Em cor rubra e mostarda
Na janela
Cortinas de chita perto da escada
Cactos na varanda
Ao lado das orquídeas brancas
Murchas sem se hidratar.
Os bambus envernizados são o contorno dos quadros
Iluminados por lustres entre palhas trançadas
O pano de saco cobre o sofá
Fofo em tecido de retalhos
No canto de lá
Mais almofadas alaranjadas
Como outros detalhes da casa.
Nos tapetes
Aroma de sálvia
Sabonete líquido
É de eucalipto
O banheiro exala
Alfazemas no box
Só para os hóspedes
Banheira salgada em sais coloridos
Poltrona de porcelana
Puro decorativo que descansa
A velha comparsa de suspiros.
O olhar para fora
Vê a vida que se renova
No dia de sertão raro
Torna úmido o que a natureza fez chover.
Mais uns passos, o quarto
Azulejos quebrados na varanda
Rede através da moldura branca
Piso sem brilho e cadeira de balanço
Porta de vidro
Vista além do sítio
Reconhece de longe o rio
Entre campos e nuvens em preto e branco
Quase chove e faz frio
Traz de volta a época de criança
O motivo da casa fechada
Do cachorro não esperar na escada
Do louro que agora se cala.
A casa continua aurora
Sem dono é como sono que não se acorda
Lembrança de primavera ou outono
Quando vínhamos todos passear
Em feriados, com direito às flores e ao pomar
Os mais velhos velejavam
E tinha quem gostasse de pescar
As crianças queriam de tudo
Ficavam nos fundos pra brincar
As avós plantavam e regavam
Cozinhavam doces e vários pratos
Enfeitavam a mesa de flores
Abriam a porta pra quem quisesse chegar
A mãe cuidava dos enfeites e das compras
Dos animais e das pernas longas
Enquanto os homens se enrolavam com a lenha.
No tempo em que o fogo era brilho
Bons tempos de amigos e família
A turma chegava e saía
No ontem que valia a pena
Sem regras rígidas pra respeitar
A ordem do dia não se perdia
Era celebração da vida em primeiro lugar
Enquanto hoje, a porta está fechada
É preciso esquecer as mágoas
E abrir pra recordar.  

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