SAUDADE (S) DE MINAS
I
Lá tem rio que corre no mesmo sentido
Tomamos café com fragrância de plantas e
frutas do pomar
É um lar cheio de mãe, primos e melhores
amigos
Os mais sinceros sem minerais antigos.
É hora de espreguiçar embaixo do pé de
mangas
Comer goiaba branca e começar a prosa
Teto de uvas protege o caminho ao lado
da acerola
Maritacas disputam as jabuticabas
Rolinhas cutucam o mamão maduro
E fogem das rosas com belos espinhos...
A saudade começa pela entrada de grama
esverdeada
Espessa como esparramar-se num cochilo
no sofá
Deitar ao som de canarinhos
Beija-flores no fim da tarde
E vaga-lumes quando a noite chegar
Cumprimentam a lua cheia no quintal
Na estrada
Na estrada
Iluminam onde não alcançam as estrelas.
Ao amanhecer, as expectativas batem
palmas
É hora de preparar pão de queijo e levar
pra mesa
Está tão bonita!
Tem bolo de cenoura e milharina sem
margarina
A broa faz companhia ao real mel de
abelhas
E seguem todos a papear.
No lugar que é lanche e sobremesa
Manteiga de leite ou geleia com biscoitos
Passa da hora de beliscar
A carne assada está no ponto
Cortada em pedaços e verdades
Sem hora pra parar de assar.
Lá vêm os acompanhamentos no bordado
Feijão tropeiro com couve e ovo pra
degustar
Pão, mandioca e vinagrete
De quem se empenha até o jantar
Faz comida no fogão à lenha
E reclama quando deixa esfriar.
Mais dose de café e pão com queijo
Doce de sidra sem bicho de pé
O cãozinho amigo abana o rabo
Se distrai pra sorte do gato
Que rouba um pedaço e sai sem ele
perceber.
Em muitas tardes dessas
Sol nas flores na entrada empoeirada
Papo pro ar com cerveja gelada
Banquinho à noite é na calçada
Com petiscos e samba pra acompanhar
O sertanejo fica na rede da varanda
Faz o quilo do mingau e das pamonhas
Com direito a papo furado e cana branda
Fuma paiero e ouve rock dos anos 70 ou
mantra.
Dormir cedo é regra pra quem se cansa da
vida farta
Do vento leve nas samambaias esverdeadas
Da tão sossegada casa!
Quer água morna pra repousar na mata
Estórias engraçadas pra criança esperta
Com medo de cigarras e corujas raras
Outras escondidas nas cobertas
Terminam com assuntos de homem e mulher
Derramam condições conflituosas depois
da janta
E dizem: aqui se colhe o que se planta.
De volta à bebida gelada ou branca
Magra após o cafuné
Quem coloca limão e sal vira criança
A brincadeira varia de médica a santa
E as fofocas continuam de pé.
II
Bom mesmo é quando falta rede
Digital só o sertanejo atual
Sem viola, a música dá sede
Pede Pena Branca e gargalhadas para o
nada
Como cachoeiras doces pra quem não paga.
Esconde a roupa pra dar em causo
Bate palmas pros peixes quando saltam
Anda na madrugada sem assalto
Brinca de pique e se esconde na
bananeira
Só torce pra não passar nenhuma
rasteira.
A assombração só chega na madrugada
Saliva quem chega primeiro na cerca das
palavras
O galo canta e anuncia o atraso de ir
pra cama
Depois de tirar carrapichos da canela.
Com o preparo da leitoa vem pururuca das
mais boas
Na cozinha da tia que amassa a rosca na
pia
Enquanto a mãe coloca outras coisas pra ferventar.
Temos salada de jiló ou berinjela
São deliciosas e é difícil acreditar
Quiabo com frango na panela
O café da noite se encerra
Quase um açoite depois que o sol raiar
É hora de acordar!
Ir à feira da taioba bem cedo
Pegar pequi e jurubeba pro almoço
Mas não pode esquecer
Tem que providenciar mais tira-gosto
Antes do galo cantar e o sol nascer de novo.
Cochichos e segredos de churrasco são
compartilhados
Diversão pra longas horas enquanto ali
ficar
Mergulho na piscina do rancho
De onde vem mandioca gigante pra fritar
Mistura de abóbora em doce de compota
Como novas caldas quentes de janeiro
Os irmãos goianos juntam-se aos mineiros
Ninguém quer ir embora
Mas as férias têm que acabar
A saudade de Minas não tem hora
São muitas histórias pra lembrar.